Primeira manhã de Carnaval – ah, que sensação boa! Subo uma ladeira em Santa Tereza atrás da folia, que pulsa e pula à vontade, em Belo Horizonte. Muitas vias estão fechadas e é preciso andar a pé vários quarteirões até a rua Mármore. Hoje é o dia do bloco Divina Banda, ao som de tambor mineiro. Acompanho a moçada transbordante de vitalidade; casais de todo jeito, famílias com crianças, foliões velhinhos e velhinhas que, simplesmente, não são o que são. A animação é geral.
O sábado é de muito sol sem nuvens, com possibilidade de trovoadas e pancadas de chuva à tarde – avisou o meteorologista – mas ninguém parece interessado nessa previsão agora. O clima para hoje aposta em outro tipo de promessa: ficar alegre, feliz, pelo maior tempo; se possível, para sempre.
Por isso, as faces sorridentes, as sainhas de tule, as asinhas de anjo para capetinhas de bigode; os biquinis para todes, as máscaras de borboleta, os amados e eternos colares de flores, chapéus de pirata, glitters, mil disfarces! As piadas barulhentas do momento aparecem em cartazes e vestimentas improvisadas. Tudo que fizer valer diversão e realizar o sonho – a baixo custo e muitos sorrisos – está valendo!
Ouço batuques vindo; é de pessoal animado, mas, sem aquele poderio que só uma bateria caprichada provoca… Faltam os cantores e músicos em cima do carro para puxar as marchinhas, o samba, o axé; falta a percussão para arrebatar cabeça e coração, arrastar milhares de foliões, cantando e dançando por quilômetros a fio, haja chuva ou sol. E o bloco Divina Banda vai provocar isso!
Estamos quase lá. É engraçado – não vejo apressados. Caminhamos devagar, saboreando o tempo, que está fresco e apetitoso. Segundo minha teoria científica para o carnaval de 2023, tal ânimo ocorre porque, estando agora visivelmente mais alegres, e sendo a alegria uma preciosidade, queremos fazê-la perdurar. Aí, é preciso segurar a alegria com todo jeito e cuidado; vivenciá-la com calma, de modo a não a perder de vista. Para que não suma do mapa, como aconteceu nos últimos anos.
Enfim, a praça Duque de Caxias, ensombrada por árvores espetaculares, e às 11h, tomada por foliões em concentração. O Divina Banda ensaia o som. Vendedores ambulantes empurram carrinhos com bebida gelada, churrasquinhos, caldos, feijão tropeiro, picolés, até algodão doce, provocando as crianças. Tem adereços aos montes – brincos, leques, bisnagas com espuma, capas – para não ficar, ninguém, sem uma fantasia qualquer. Os rostos estão alegres, de suavidade diferente; três garçons tagarelam e riem, enquanto aguardam a função no restaurante local; um cão dorme folgado ali mesmo.
Estou alegre também, e acho essa alegria, bom prenúncio de estação. Depois da tristeza sem fim experimentada na pandemia, e das raivas absurdas na última temporada política, o carnaval veio liberar nossa capacidade de agregar para sonhar.
Estão tocando, o Divina Banda vem aí esquentado! Agora a multidão vai dançar e cantar – meio desafinada – mas, toda gente junta e misturada. Uma beleza!
France Gripp
BH, 26/02/2023
Maravilha !!!
Obrigada, primo!
France, dublê de foliona e poeta/escritora. Adorei sua crônica.